terça-feira, 17 de dezembro de 2019

uma hora

você se lembra daquelas nuancias
dos dedos que corriam pelos seus cabelos
do toque frio nas suas costas
dos pés quentes, juntos
dos dedos macios, entrelaçados

eu me distraio do dia a dia com
um cigarro no cinzero e uma
cerveja na bolacha
em cima da mesa de madeira
com seus rachados aqui e
alí
aqui e
alí
também

eu costumava a gostar de reparar
nas sutilezas que eu não percebia
nos olhos azuis que passavam por mim
pela rua
nos perfumes femininos que
me cheiravam de volta
com meu cheiro de tabaco
e old spice

uma hora
de tanto remendar
a gente prefere deixar as
coisas como estão
alí
paradas
ficamos rígidos e frios demais
pra amar

eu li outro dia que o amor
é para os fortes
para os persistentes
para os corajosos
esqueceram de lembrar, talvez
que uma mão
precisa
lavar a outra

uma hora
de tanto costurar
pele aqui, pele alí
esses nós de linha
dão tanto medo de
se abrir
novamente
pra deixar um novo ar entrar
pra deixar um novo mundo colidir
pra deixar um novo universo se expandir
pra deixar um novo presente
chegar

uma hora a gente
cansa
uma hora a gente
aprende a
esperar
por aqueles dedos
aquela mão
macia
que quer correr pelos nossos cabelos
que quer acariciar nossos corpos
que quer se jogar no mar e
se lavar com a gente

uma hora de
tanto procurar
a gente aprende
que talvez
só se consiga achar por

esses terríveis abismos
que talvez sejam a causa de nós
escurecermos cada vez
mais e
mais
e mais

uma hora
a gente cresce